A René Magritte
Um rapper brasileiro, ex-integrante da banda Planet Hemp, em um gesto freudiano de reversão do tabu em totem assumiu para si a condição de alienígena, autodenominando-se Black Alien. Na impossibilidade de inverter a marca estereotípica que repousava sobre seus caracteres corpóreos (nesse caso fenotípicos), em um jogo escópico ao qual estava submetido e que o fixava desde criança como diferença inferiorizada, esse músico põe em suspenso a designação pejorativa que o afligia, e, claro, as atitudes que como conseqüência vinham com ela, para assumir-se de forma reversa como, assombrosamente, O Outro. Vale salientar aqui a força desconstrutora dessa ação sofisticada que convoca os espectros do unheimlich, possibilitando que esse sujeito se desconheça, para, só assim, lidar com toda a força que produziu em sua vida um poderoso recalque de seus traços étnicos em seu processo de subjetivação e que, agora, como o estranho freudiano, emergem aparentemente como des-conhecidos.Como o surrealista René Magritte provoca a fissura em seus quadros entre as palavras e as coisas, esse rapper grafa, grifa e grafita sobre o corpo a mesma senha que obriga o observador de arte a suspeitar da representação pictórica que ele crê ver nas telas do pintor belga. Em um quadro de Magritte, por exemplo, que traz a imagem de um cachimbo (?) seguido da inscrição “Ceci nést pas une pipe” (Isto não é um cachimbo) o pintor desafia de forma suicida a própria representação, ainda que esta seja o sustento de toda uma teoria mimética legitimadora das artes desde Aristóteles. Ora, tanto no gesto do pintor quanto do rapper, a provocação repousa na desconstrução da lógica do sentido, a qual, através de sua relação imediata, aparentemente natural, entretanto etnofalologocêntrica, aprisiona os sujeitos a formas prévias de significação, nada neutras, diga-se de passagem. É contra essa mesma força paralisante e perigosa que se erige boa parte dos escritos de Giles Delleuze, Michel Foucault e Jacques Derrida, só para citar alguns dos chamados filósofos da desconstrução. Ambos os procedimentos, o de Magritte e o de Black Alien, exigem a deseducação de um sistema tradicional de deciframento para que o quadro e mesmo o nome do rapper possam, libertos, enfim funcionar como uma superfície plurissignificante. Em suma, não há desafio mais dilacerante na contemporaneidade do que assumir-se como O Outro, pois o alien, acima de tudo, é aquele que está alheio a, que escapa a toda uma lógica de normalização do olhar, do corpo, transitando fraturado por entre suas identificações fluidas… O alien não pode ser facilmente aprisionado, nem completamente entendido (ele está fora de si) e eis aí a sua potência como alteridade, a qual, mesmo que, muitas vezes, silenciosa, rasura de forma interminável a superfície invisível das relações sociais e de um sistema ortodoxo de construção do saber. Além disso, ele representa, indubitavelmente, o maior desafio para a humanidade, ainda que não “seja” demasiadamente humano, ou não seja historicamente construído como tal…Como educadores, creio que o nosso maior desafio não se coloca apenas em amar o alien (entenda-se por alien toda a alteridade, ainda que aqui eu esteja destacando apenas uma dessas formas alienígenas), mas sim em compreendê-lo na e contra a paisagem gris em que ele se soergue. Tarefa, com certeza, nada fácil, para nenhum de nós.
Um rapper brasileiro, ex-integrante da banda Planet Hemp, em um gesto freudiano de reversão do tabu em totem assumiu para si a condição de alienígena, autodenominando-se Black Alien. Na impossibilidade de inverter a marca estereotípica que repousava sobre seus caracteres corpóreos (nesse caso fenotípicos), em um jogo escópico ao qual estava submetido e que o fixava desde criança como diferença inferiorizada, esse músico põe em suspenso a designação pejorativa que o afligia, e, claro, as atitudes que como conseqüência vinham com ela, para assumir-se de forma reversa como, assombrosamente, O Outro. Vale salientar aqui a força desconstrutora dessa ação sofisticada que convoca os espectros do unheimlich, possibilitando que esse sujeito se desconheça, para, só assim, lidar com toda a força que produziu em sua vida um poderoso recalque de seus traços étnicos em seu processo de subjetivação e que, agora, como o estranho freudiano, emergem aparentemente como des-conhecidos.Como o surrealista René Magritte provoca a fissura em seus quadros entre as palavras e as coisas, esse rapper grafa, grifa e grafita sobre o corpo a mesma senha que obriga o observador de arte a suspeitar da representação pictórica que ele crê ver nas telas do pintor belga. Em um quadro de Magritte, por exemplo, que traz a imagem de um cachimbo (?) seguido da inscrição “Ceci nést pas une pipe” (Isto não é um cachimbo) o pintor desafia de forma suicida a própria representação, ainda que esta seja o sustento de toda uma teoria mimética legitimadora das artes desde Aristóteles. Ora, tanto no gesto do pintor quanto do rapper, a provocação repousa na desconstrução da lógica do sentido, a qual, através de sua relação imediata, aparentemente natural, entretanto etnofalologocêntrica, aprisiona os sujeitos a formas prévias de significação, nada neutras, diga-se de passagem. É contra essa mesma força paralisante e perigosa que se erige boa parte dos escritos de Giles Delleuze, Michel Foucault e Jacques Derrida, só para citar alguns dos chamados filósofos da desconstrução. Ambos os procedimentos, o de Magritte e o de Black Alien, exigem a deseducação de um sistema tradicional de deciframento para que o quadro e mesmo o nome do rapper possam, libertos, enfim funcionar como uma superfície plurissignificante. Em suma, não há desafio mais dilacerante na contemporaneidade do que assumir-se como O Outro, pois o alien, acima de tudo, é aquele que está alheio a, que escapa a toda uma lógica de normalização do olhar, do corpo, transitando fraturado por entre suas identificações fluidas… O alien não pode ser facilmente aprisionado, nem completamente entendido (ele está fora de si) e eis aí a sua potência como alteridade, a qual, mesmo que, muitas vezes, silenciosa, rasura de forma interminável a superfície invisível das relações sociais e de um sistema ortodoxo de construção do saber. Além disso, ele representa, indubitavelmente, o maior desafio para a humanidade, ainda que não “seja” demasiadamente humano, ou não seja historicamente construído como tal…Como educadores, creio que o nosso maior desafio não se coloca apenas em amar o alien (entenda-se por alien toda a alteridade, ainda que aqui eu esteja destacando apenas uma dessas formas alienígenas), mas sim em compreendê-lo na e contra a paisagem gris em que ele se soergue. Tarefa, com certeza, nada fácil, para nenhum de nós.
Por Henrique Freitas
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